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Os tempos livres

29.04.18

Nem só de arrozdestruição de jipes (sobre)vive um jovem Português na Guiné-Bissau. Neste post vou falar do que faço nos tempos livres.

 

Bom, como já disse, a Guiné-Bissau não é um país muito virado para o turismo, principalmente na zona romota do sul. Mesmo assim, um jovem arranja coisas para fazer quando não está a fazer mais um guião sobre o Microsoft Word ou a pesquisar como é que se conjuga o verbo 'ir' no Pretérito Imperfeito do Indicativo na 2ª pessoa do plural. 

 

Conhecendo as redondezas

 

O Valberto tem bicicletas aqui em casa. Já usei várias vezes para fazer uns passeios, sempre acompanhado. Estes passeios são feitos durante o fim-de-semana porque pode ser preciso um dia inteiro para visitar os sítios como deve ser. Conheci diferentes tabancas em que basicamente o melhor e o que ocupa mais tempo nestas aventuras é o caminho até ao destino. Conheci Jemberem (uma tabanca em plena reserva natural do Cantanhez), Campeane, uma tabanca que não me lembro do nome a sul de Cacine, Ilha do Mel (é um sítio quase deserto, inóspito e completamente no meio da natureza) e Cassumba (praia incrível). Alguns sítios até já tive oportunidade de ir mais que uma vez, por exemplo, Cassumba.

Estas aventuras de fim-de-semana são um bocado desgastantes porque envolvem andar de bicicleta durante várias horas seguidas. Chego ao fim do dia cansado e porco mas contente por ter feito o passeio. É fixe porque são sempre coisas novas que conheço, que acaba por ser um bom twist na vida rotineira que aqui tenho.

 

Em Cacine

 

Já antes falei da praia de Cacine. Ao todo devo ter ido umas 10x, o que não é muito considerando o tempo que passou desde que aqui cheguei. Durante a semana não há muito tempo e ainda são uns 20 minutos a pé, pelo que é raro ir durante a semana.

Por falar em casa, o sítio é muito fixe (acho que nunca falei aqui muito do espaço à volta da casa). São várias casas no mesmo recinto (uma delas a minha) com bastante espaço ao ar livre, flores, árvores, gatos, galinhas. Inclui também umas redes onde às vezes leio ou durmo a sesta.

Além disso, aqui por casa costumo jogar às cartas com miúdos que vivem perto. 
O jogo de eleição é o Uno. Como existem muitas maneiras diferentes de jogar Uno, tive que lhes ensinar a que eu sei, porque é a melhor. Vá, estou (meio) a brincar. A verdade é que antes os miúdos jogavam com regras que facilitavam muito o jogo. Eu diria que se divertem mais agora com as novas regras.
Além do Uno, também se joga um jogo chamado Baralho. Este jogo já se joga com um baralho de cartas normais. O jogo é exactamente como jogar à bisca, mas nunca tens de assistir. Também é parecido com a sueca porque, quando jogado por 4 pessoas, formam-se pares. Mas não é preciso assistir na mesma (palhaçada). Este já joguei algumas vezes com pessoal da minha idade. Até me safo. Os miúdos não jogam tanto este porque é um bocado mais complexo que o Uno. 

Este momentos de cartada são engraçados porque aprendo bastante crioulo durante os jogos e porque acaba por ser sempre engraçado.

E pronto. Em relação às aventuras e como podem imaginar, cada aventura destas seriam dignas de posts grandes para cacete. Histórias que vão desde barcos furados mas funcionais, lama até aos joelhos, conhecer espécies novas e comer comida com muita malagueta do mesmo tacho com outras pessoas. Mas não me apetece muito, até porque algumas destas aventuras já aconteceram há muito tempo. Menos para vocês lerem, meus caros 23 amigos. É muito isto.

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publicado às 14:33

Relacionado com os aspectos "prático-filosóficos" mencionados no post passado da minha experiência aqui na Guiné, é a questão da saúde vs experiência.

 

Então, só para dar um contexto, eu sou um jovem um bocado despreocupado com as questões de saúde (vocês que o digam). No entanto, antes de vir para cá, falei com alguém que já tinha vindo que me chamou à atenção os vários cuidados que é preciso ter e as consequências de não os seguir. Pôs-me em alerta. O que se passa é que tudo é diferente do ambiente a que estou habituado em Portugal, a dizer: 1) ser um sítio com um clima muito atraente para todos os tipos de bichos, formalmente conhecidos como bactérias 2) é um sítio onde a higiene pública é um problema 3) o meu organismo não está preparado para este contraste.

O dilema com que me deparei aqui é a questão de ter demasiado cuidado e sobreviver a esta experiência contra aproveitar bem a experiência e falecer de forma dolorosa. O meu objectivo é manter-me no meio. Ou seja, não quero ser uma pessoa demasiado preocupada com os aspectos de saúde porque não vim aqui só para sobreviver, vim para fazer uma experiência. Também não convém ficar doente, porque quer dizer que não posso continuar a viver a experiência.

 

Água

 

Os cuidados a ter com a saúde estão relacionados com muitos aspectos práticos, um deles é a água. Diz que há bichos que fazem cocó na água e que não é muito bom beber dessa água. Onde estou a viver a água vem de um poço que está cá em casa, portanto é mais confiável que a água seja boa. No entanto, houve uma vez que o ponta da torneira da minha cozinha caiu e eu, ao montá-la de novo, deparei-me com uma boa quantidade de terra, que sempre esteve ali. Quando isto aconteceu, já estava há um mês e meio a usar aquela torneira. Se pudesse escolher, preferia não ter sabido.

 

Comida

 

Já aqui falei das maravilhas da cozinha guineense . Um dos costumes diferentes aqui é que as famílias comem todos da mesma tigela, o que é um belo momento de partilha, mas que me chocou ligeiramente a nível de higiene quando vi pela primeira vez. No meu dia-a-dia cada um come do seu prato mas já houve ocasiões em algumas ocasiões fui a casa de outras pessoas e comi dessa maneira original. Sobrevivi.

Já agora, aprendi que é uma ciência comer do mesmo prato que as outras pessoas. Normalmente há uma tigela maior só com arroz e a má fé (que pode ser peixe ou carne com um caldo qualquer) está numa panela à parte. Uma das pessoas distribui a má fé pela tigela do arroz. A regra mais importante é que cada um só come do seu lado da tigela; imaginem um circulo, come-se o que está na parede da tigela mais próxima de ti (estou a esforçar-me, mas não consigo explicar melhor que isto). Vai-se comendo até chegar ao centro da tigela. Quando já é díficil dizer qual é o teu espaço, não há grandes regras mas também já é quando toda a gente está satisfeita, à partida. Portanto, quem quiser, que coma. Engraçado de comer dessa maneira é que a malagueta já vem misturada. Tem sempre um bocado a mais do que o paladar deste jovem português tolera, mas também não é insuportável.

De resto, um cuidado a ter é com coisas que não são cozinhadas, quando não se sabe se foram bem lavadas. Por exemplo, é de evitar comer salada ou fruta. Um destes riscos, que facilmente pode passar despercebido, é beber uma bebida com gelo porque a água que foi usada para o gelo pode ter cocó de bichos. Como gelo é um luxo aqui em Cacine, nunca tive esse problema *vantagens*. Isto do gelo devia estar na secção da água, mas foi no seguimento do que estava a dizer. Vocês percebem.

 

Mosquitos

 

A malária é transmitida através da picada do mosquito, que normalmente estão a "laurear a pevide" desde o pôr-do-sol até amanhecer. Por isso, andar na rua nesse horário é um risco. O melhor que há a fazer é dar uma aula de informática das 20h às 21h30, dizem os médicos. Além disso, deveria dormir com rede mosquiteira, mas é granda seca. Não é muito mau porque a casa onde estou tem redes nas janelas. Antes da aula de informática ponho repelente para mitigar o risco, tem sido suficiente. Por outro lado, a malária demora entre 3 a 10 dias até manifestar os sintomas, seria irónico estar a escrever isto já com o destino traçado.

 

YOLO

 

O que nos leva a esta secção. Chamei-lhe YOLO mas na verdade também vou apregoar a moderação. Parte da experiência é arriscar e pôr de parte os cuidados que aqui falei para poder fazer a experiência cultural completa. Isto passa por comer como os guineenses e andar na rua à noite, sem pensar muito nos mosquitos. A minha estratégia para esta viagem foi arriscar gradualmente, para dar tempo ao meu organismo para se habituar.

Por exemplo, nos primeiros dias, em Bissau, até lavar os dentes usei água de garrafa. Nesses dias, comprei umas 15 garrafas de água e trouxe para Cacine. Desde então não comprei mais, façam as contas para os dias desde que estou cá. Mas tranquilo, trouxe umas pastilhas para desinfectar a água e uso-as num 1,5L de água por dia. Ao almoço, nas primeiras semanas, não bebia água porque sabia que vinha directamente do poço. Agora já bebo despreocupadamente. Também como salada, porque é raro quando há.

Claro que já fiz a pesquisa "how to know if you have parasites in my stool" e provavelmente tenho seres indesejados a conviver no meu estômago. O meu plano é, quando regressar a Portugal, ir a uma consulta para ver se está tudo ok. "Vai dar certo".

 

Acho que este post até é útil para quem vai passar algum tempo num país com um clima tropical. Aproveitem porque posts úteis não abundam neste blog, ao contrário de posts grandes pa cacete. Como estão as vossas fezes nestes dias, 22 amigos? É muito isto.

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"Olá, sou a Bé. Tenho 20 anos, vivo em Cascais e sempre quis ajudar quem mais precisa. Decidi ir para África e estou a amar conhecer este povo maravilhoso. As pessoas são lindas, o país é lindo, tudo é belo."

 

Cala-te, Bé (ou lá como te chamas).

 

Pragmático

 

Até agora, neste blog, o leitor atento pode pode dizer que este Jovem Português na Guiné-Bissau só faz posts a gozar, com um pico de arrogância. "Ele está a gostar da experiência, sequer?" Onde estão as fotos com crianças carenciadas à volta? Onde estão as frases "estou a amar este povo"?

A verdade é que esta foi a maneira que eu escolhi para descrever a minha experiência, uma personagem, digamos. Não é personagem no sentido que não sou eu, mas claro que estou a omitir algumas coisas, mostrando apenas uma face. Sou muito mais lamechas no meu diário, que guardo ao pé do livro de reclamações.

Tento ser, acima de tudo, pragmático. Sou pragmático no sentido em que sei que nem tudo é belo, este povo, como sociedade, não é perfeito. Pragmático também no sentido em que vim aqui para a Guiné-Bissau para fazer uma experiência benéfica para mim. Se no processo conseguir beneficiar a vida de outras pessoas, é bónus. Isto porque não me iludo ao pensar que sou importante o suficiente para "mudar o mundo" com esta experiência.

Um dos aspectos que debati comigo mesmo, quando pensei em fazer voluntariado foi "Por quanto tempo? Praí 6 meses", pensei. Ok, não vou fazer tanto tempo quando pensava na altura, mas cedo percebi que não queria fazer uma experiência curta (menos de um mês). É fácil numa experiência de um mês ser a Bé, ou seja, viver numa ilusão de que tudo é perfeito. Eu quis fazer uma experiência de mais do que um mês por duas razões 1) queria conhecer a realidade, com tudo o que tem de bom e de mau, ou seja, entrar na rotina 2) não queria ficar com a sensação de "saber a pouco". E é o que está a acontecer. Durante a minha estadia, já tive momentos em que queria estar em Portugal. Esses momentos fazem-me perceber que já entrei na rotina. É certo que é durante poucos meses esta é a minha vida quotidiana.

Outra coisa que me faz um jovem que pensa que é hipster e fora do esperado, é que planeio que esta experiência seja benéfica para mim a longo prazo. Não vim para aqui tendo deixado uma vida desinteressante em Portugal, fugindo a problemas. Antes tinha uma vida boa, estou a ter uma vida boa e diferente agora e, quando voltar a Portugal, planeio ter uma vida boa também. Esta experiência não é uma coisa isolada que vai ser o ponto alto da minha vida (espero eu).

Tudo isto faz com que tenha uma frieza acima da média, sim, mas não quer dizer que sou indiferente à experiência que estou a fazer. A minha vida não muda por haver Bés, por isso não julgo quem tenha essa atitude. Eu simplesmente, não quero ser a Bé, apesar da atitude dela ter aspectos bons. Por exemplo, é importante entrar na rotina, mas também é importante policiar-me para que a minha rotina não se torne aborrecida. Para isso, faço sempre por conviver com o pessoal daqui ou por passear por aqui perto.

 

Voluntário

 

Posto isto, vou gastar o resto do post a provar que, apesar de ser assim esquisito, estou a fazer uma experiência incrível. Chamemos-lhe "o momento Bé".

Sou um previligiado. Isto de fazer voluntariado é das melhores ideias que já tive. Fazer férias é engraçado mas é caro. Fazer voluntariado é bom porque consegues, com menos dinheiro, conhecer um país da melhor maneira: através dos nativos desse país. E eu não fazia ideia que este país era tão bonito. Tenho tido hipótese de passear, nalgumas ocasiões, e sei que, se não fosse a fazer voluntariado, não teria hipótese de visitar esses sítios. Também tenho tido hipótese de saborear os produtos desta terra (alguns que nem nunca tinha ouvido falar) e, como estou num meio rural, existem em abundância. Além disso, estou a ter a hipótese de conhecer pessoas que, por terem uma cultura diferente da minha, pensam de maneira diferente também. Principalmente no início, é díficil os dias serem aborrecidos. Resumindo, com a data de regresso mais próxima que a data de chegada, estou a sentir-me muito bem por cá.

Claro que isto não quer dizer tudo sejam rosas, a maioria dos meus dias é passado a dar aulas ou a preparar aulas, algo que dá mais trabalho do que pensava (respect para os professores que têm que fazer isto durante mais tempo).

 

Não sei se este é o meu post mais estranho, ao menos continua a ser grande pa cacete que é para não destoar muito. É mau ter esta dúvida porque quer dizer que há outros que talvez também sejam. Mas enfim. Mais um post neste país belo e este povo maravilhoso. "Já chega, Bé. Os meus 21 amigos não têm que te...ler". É muito isto.

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publicado às 21:00

Uma coisa que não gosto nada é quando me falam de alguém e eu não tenho a imagem mental da pessoa em questão. Como posso não ser o único jovem com este problema, este post apresenta as pessoas que referi no post anterior. 


Alia, eu e o Francisco. Adivinhem...em Cassumba:

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Eu e Alia:

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Muita gente. A Helen está à direita: 

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 Eu e o Valberto. Reparem na minha t-shirt. Sejam sinceros: passo por guineense? Tentei.

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Robinho. Não tenho muitas fotos dele, na verdade. No outro post, ele aparece na dos côcos (no meio). Mas como não gosto de fazer batota, não vou repetir a foto.

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No geral, não gosto de tirar fotos a pessoas. Acho desinteressante. A prova é o meu instagram. Se quiserem conhecer a Guiné-Bissau, sem ter que ver a minha cara ou ler este blog, recomendo.

P.S.: Para quem estiver com dúvidas, não estou sempre a usar chapéu.

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No post anterior, falo dos meus almoços. Esses almoços são apreciados na companhia de várias pessoas. Por essa razão e porque já tinha dito aqui no blog que iria falar sobre eles, parece-me uma desculpa para vos apresentar as pessoas que estão a marcar a minha experiência aqui na Guiné-Bissau. 

 

Francisco

 

Foi o Francisco que deu um destino a este meu plano de fazer voluntariado fora do país. Alguém mencionou que ele vive em Bissau e eu decidi falar com ele. Pôs-me em contacto com alguém que conhecia o Valberto e o seu projecto.

O Francisco é filho dos meus padrinhos de baptismo. Trabalha para a comissão europeia na área da cooperação e desenvolvimento. O gabinete dele é responsável por estabelecer o contacto com ONGs aqui da Guiné-Bissau que inclui a gestão dos fundos para as várias causas humanitárias.

Conhecia-o vagamente, nunca tivémos muito contacto, talvez por causa da diferença de idades (ele tem 36 anos, eu 24). No entanto, já depois de ter decidido que vinha para a Guiné-Bissau, ofereceu-me dormida na sua casa antes de eu ir para Cacine. Bom tropa. Também já me afiambrei para ficar na casa dele depois de sair de Cacine e antes de voltar para Portugal. Não vacilo

Além de me ter dado estadia na sua casa, cujos benefícios já descrevi aqui, apresentou-me Bissau. Também me deu a oportunidade de conhecer a realidade de europeus que vivem aqui, seja a trabalhar para a UE ou a trabalhar em ONGs. Achei impressionante. Existe malta a fazer cenas fixes e a ser bem sucedida profissionalmente enquanto ajudam um país com muitas necessidades.

Como pessoa, o Francisco parece-me bastante feliz, que me faz pensar que é uma pessoa confiante e resolvida. É muito inteligente e estudioso, desconfio que ele é bom no trabalho. Talvez por isso, consegue fazer uma experiência num país completamente diferente enquanto que tem boas condições de vida.

Entretanto, o Francisco já me veio visitar aqui a Cacine. Foi um fim-de-semana de passeio muito fixe. Também foi um óptimo fim-de-semana de abastecimento da minha humilde despensa (pedi ao Francisco para trazer alguns produtos de Bissau).

 

Valberto

 

O Valberto é talvez a pessoa mais responsável pela experiência que estou a fazer. Como já tinha dito quando apresentei a associação, é brasileiro e chegou à Guiné-Bissau há 21 anos, uma vida atrás, como pastor missionário da Igreja Envagélica. Talvez uma das coisas que desgosto nele é aquele discurso de brasileiro envangélico, de justificar as coisas com Deus nosso Senhor (não sei explicar melhor que isto). Mas tudo bem, aceitando isso, o Valberto é uma pessoa bastante inteligente e claramente benfeitora. Já não está ligado à missão envangélica para poder dedicar-se inteiramente ao este projecto aqui em Cacine. Estudou teologia e gosta muito de falar, então que temos tido umas conversas interessantes dos mais variados temas, ao almoço. Uma coisa que gosto nele e que não vai de encontro ao estereótipo de brasileiro envangélico, é que ele é bastante crítico em relação à sociedade guineense no geral. Isso é bom porque, por um lado, fico com a prespectiva boa através das vivências que tenho tido aqui e, por outro, tenho a prespectiva da realidade mais negativa de quem já teve muitas chatices. É bom ter a versão completa da experiência.

 

Robinho 

 

O Robinho é o filho adoptado do Valberto. Isto é muito díficil de encaixar na minha mentalidade ociental, mas a mãe do Robinho vive do outro lado da estrada. Simplesmente, quando o Robinho era pequeno passava muito tempo na casa do Valberto, então a família decidiu doar-lho. O Robinho sabe de tudo mas a relação com a mãe é como se fosse entre dois desconhecidos. É muito comum estas doações de filhos aqui na Guiné. Surreal.

O Robinho é um rapaz de 6 anos e tem muita piada. É aquele tipo de miúdo que é díficl de conquistar, mas a pouco e pouco acho que está a gostar da minha presença. Jogamos muito Uno, com bastante malta cá em casa, e eu gozo muito com ele, porque não resisto e porque sou campeão a jogar. Ele não gosta nada, porque é um miúdo competitivo.

 

Alia

 

O Alia é o meu buddy aqui. Temos idades próximas (ele tem 22 anos) e como também vive aqui na "propriedade" é talvez a pessoa com quem mais interajo aqui. Tem bastante paciência para me explicar coisas do crioulo, o que está a ajudar bastante. Não sei se é mesmo dele ou se a interação que ele teve com os vários voluntários que vão passando por aqui o ajudou, mas é um miúdo bastante educado e simpático. Do que já vi, é aquele tipo de pessoa em que as pessoas que o conhecem gostam dele, imediatamente. A ir para qualquer lado com ele, é normal ver muitas pessoas a cumprimentam-no. Já lhe disse que ele vai ser presidente da República da Guiné-Bissau, mas ele não me leva a sério.

Na verdade, ele está a viver na casa do Valberto porque o trabalho dele é este. Ele tem que tomar conta de muitas coisas e passa a maior parte por casa. Não obstante, é um jovem que tem objectivos. Há-de estudar o 12º ano em Bissau e, se conseguir, aspira a fazer um curso superior no Brasil. Nasceu num sítio com poucas oportunidades mas acredito que ele até se vá safar na vida.

  

Helen

 

A Helen é uma voluntária do Canadá. Tem 62 e já tem muitos anos disto. Já passou, ao todo, uns 3 anos na Guiné-Bissau, sempre a fazer voluntariado. Durante a minha estadia, a Helen concluiu os 5 meses que fez cá. Foi embora há duas semanas.

Apesar de ter idade para ser minha avó, foram fixe as interações que fomos tendo. Ela é a pessoa mais perto da minha mentalidade, inevitavelmente, ocidental. Por isso pensamos da mesma forma em relação a alguns assuntos. Além disso aproveitámos alguns fins-de-semana para fazer uns passeios pela zona, com distâncias na escala dos 40 km. Também quero chegar aos 60 com a mesma energia que a Helen.

Uma coisa fixe, foi que deu para praticar o meu inglês ao falar com a Helen. Combinei com ela só falarmos em inglês com esse mesmo propósito. Vim para a Guiné-Bissau também para praticar inglês, quem diria? Além disso, sou um bocado fascinado com sotaques, acho-lhes muita piada. Ouvir o ocasional "abôut" e a interjeição "eh", tipicamente expressões canadianas, faziam o meu dia.

Tirando estas, há mais pessoas que fazem parte da minha rotina, como os alunos de Informática e português. Mas não vos maço mais. Não consegui tornar este post, grande para cacete, mais interessante que isto. Ao menos não vos desiludo, 20 amigos. Com esta conclusão, acabo de decidir qual vai ser o título deste post. É muito isto.

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publicado às 16:30

Ora bem, neste post vou falar de como se alimenta um Jovem Português na Guiné-Bissau. Como me considero "bom garfo", tenho tido uma boa experiência por cá. Vou dividir o post em duas partes: o almoço e o jantar. Isto porque o almoço é partilhado e assegurado pela malta daqui do "condomínio" e o jantar é da minha responsabilidade. Um texto com secções também motiva um bocadinho mais à leitura, principalmente se o leitor for meu amigo e, fatidicamente, se veja obrigado a ler este blog.

 

O Almoço

 

"Diz-me o que comes, dir-te-ei quem és". Coloquei a frase entre aspas só para ser mais credível porque, na verdade, fui eu que inventei agora. De qualquer maneira, se fosse verdade, os guineenses seriam arroz. É verdade, aqui come-se arroz todas as refeições e em grandes quantidades (daí o título do post). O arroz também não é igual ao que eu estou habituado. É mais seco, mas bom. Os pratos também são, 90% das vezes, acompanhados por um caldo/molho qualquer e, como estou numa zona que vive muito da pesca, peixe peixe e peixe. Fica a faltar, na minha dieta, os vegetais. Ah e carne. Isto de comer carne, em média, menos de uma vez por semana faz-me comichão à alma. 

Pelo que disse neste parágrafo acima, parece que não gosto da comida aqui. Não é verdade. Apesar de não comer tão equilibradamente como me alimento no conforto do meu Portugal, a comida faz parte da experiência de estar numa cultura diferente e tem as suas coisas boas. Tenho experimentado comer coisas que nunca tinha comido, pelo menos cozinhados da forma que se cozinha aqui. Destaco o meu prato preferido: caldo de mancarra. Mancarra é a palavra em crioulo para amendoim. É um molho que pode acompanhar peixe ou carne e o indespensável arroz. É delicioso. Destaco, ainda, a palha de madioca que é a folha da mandioca, mancarra e peixe, tudo triturado (acomapnhado de arroz, claro) e o caldo de chabéu que é o fruto da palmeira e que é misturado com peixe e...adivinhem...arroz. No geral, a comida tem muito sabor e é pesada. Eu gosto.

 

O Jantar

 

A minha estratégia para não ter que me preocupar com lanche e para não ter que comer tanto ao jantar, é encher o prato ao almoço...e repetir. Acho que vou chegar a Portugal mais gordo, o que não deixa de ser estranho e inesperado.

Gosto de cozinhar, mas aqui vejo-me obrigado a fazer comida de estudante. Por duas razões 1) não tenho frigorífico 2) não existem supermercados que, em qualquer altura do ano, posso escolher qualquer coisa para cozinhar, quase. Aqui no mato, o que há é o que vais comer.

De maneiras que enlatados, arroz e massa tem sido a minha roda dos alimentos. Nas pequenas lojas que há por aqui em Cacine compro bastante latas de sardinha e corn beef. Sardinha enlatada é algo que só conhecia de nome antes de vir para cá. Não é tão mau como soa. Em relação ao corn beef, que também nunca tinha comido antes, não o consigo descrever de outra maneira que não esta: é o interior da salsicha em lata. Portanto, não é nada mau. Algumas latas de corn beef têm o símbolo do halal, que é apenas uma formalidade visto que não deve haver carne nenhuma no conteúdo das latas. De qualquer maneira, talvez vá para o céu muçulmano quando lerpar. Já valeu a pena, a viagem.

Curiosamente, viver sem frigorífico não é tão difícil assim. Talvez por causa da quantide de químicos que a comida tem, as coisas aguentam mais do que parecem. Acho que usava o frigorífico desnecessariamente em Portugal.

Calma, mãe, não estou a comer assim tão mal. Acho que a alimentação foi o aspecto que me preparei melhor na minha pré-viagem. Pelo menos, foi o que perdi mais tempo a pensar. Além do que trouxe comigo de Portugal, o Valberto já foi duas vezes a Bissau desde que eu estou cá e eu peço-lhe para trazer umas cenas diferentes. Sabiam que existe iogurte grego que não precisa de ir ao frigorífico?

 

Um aparte picante

(Menti. Afinal vão ser três secções).

 

Dedico uma secção à malagueta. Em Portugal, não costumo comer picante, simplesmente não foi um hábito que me foi incutido enquanto crescia. Aqui na Guiné, principalmente aqui no sul que é bem representado pela etnia Nalú, todas as refeições têm de incluir malagueta. É impressionante ver a quantidade de malagueta que crianças com apenas 3 anos de idade comem. É de fazer chocar um mexicano. 

Segundo o que tenho visto nalgumas casas, a malagueta já vem misturada na comida. Aqui em casa, a malagueta é posta à parte, para que quem quiser possa pôr a quantidade que quer na sua comida. Suponho que seja uma proteção que o Valberto criou para os estrangeiros que não estão habituados. A pouco a pouco e por curiosidade, comecei a experimentar pôr um bocado de malagueta na comida. Normalmente, vêm num frasco com vinagre, cebola e alho. A verdade é que é excelente e combina muito bem com a comida. Não tolero uma grande quantidade de malagueta ainda, mas gosto bastante. Desconfio que este hábito perdure quando voltar a Portugal.


Está feito. Se tivesse que nomear o que sinto mais falta nesta minha viagem é da comida em Portugal. Lamento, 19 amigos. Como amigo, sou aquilo que como aqui na Guiné: previsível. Termino mais um post desnecessariamente grande pa cacete. É muito isto.

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Num post anterior falei da minha percepção em relação a alguns aspectos sociais da Guiné-Bissau, particularizando os aspectos negativos. Claro que a cultura da Guiné-Bissau tem coisas boas e o facto de muitos aspectos serem diferentes da minha realidade portuguesa, torna cada dia uma descoberta cultural, para mim. Apesar de tudo, prevejo que este post vá ter a mesma estrutura algo desconexa que o outro post tem. Devo avisar, também, que não quero generalizar estes costumes para toda a Guiné-Bissau. O que eu conheço é a realidade duma zona rural do sul do país. E mesmo essa realidade, é de acordo com a minha prespectiva.

 

Então, a ideia geral que eu tenho é que as pessoas aqui são felizes. O dia-a-dia apresenta muitas dificuldades para os guineenses, desde o difícil acesso a electricidade, comida até à água. Mas é a realidade daqui, portanto, a vida é para continuar. As pessoas são descomplicadas e bastante práticas.

O primeiro hábito estranho que vou descrever é o simples acto de bater à porta. Vim para cá a pensar que só havia uma maneira de bater à porta. Em vez de bater na porta com o nó dos dedos da mão, como conhecemos, os guineenses param em frente à porta e dizem “cong cong”. Passei muito tempo a pensar porque é que haveriam de fazer isso, é uma maneira menos eficaz de fazer com que alguém vá abrir a porta (vezes demais, já deixei pessoas à porta da minha casa por não as ouvir a “bater à porta”). Depois de ter comentado com o Francisco, um estrangeiro que também desconhece a razão, ele disse que talvez seja porque nem sempre há portas. Claro! As casas aqui não são de grande qualidade de construção e uma das coisas que não devem ser necessárias são portas, devido às altas temperaturas. Em vez disso, as portas normalmente têm um pano qualquer, só para não se ver para dentro (claro que acontecem coisas de terem que expulsar seres indesejáveis, como eu já vi fazerem a um rato). De qualquer maneira, tal é o hábito de dizer “cong cong” em vez de bater à porta, que quando estão em frente a uma porta de madeira, continuam a dizer “cong cong”. Para não destoar ainda mais e ainda antes de saber a razão, comecei a fazer o mesmo. Rezo para que, quando voltar a Portugal, não mantenha este hábito ou então talvez perca os meus escassos 18 amigos.

Um outro hábito que reparei (e que não vai gastar um parágrafo com tamanho absurdo a descrever) é o facto de se oferecer a cadeira a qualquer pessoa mais velha que chegue. Não precisa de ser um idoso. Quando estou num espaço onde estão crianças a fazer alguma coisa sentados, por exemplo, é um cuidado imediato oferecer cadeira para eu me sentar. De qualquer maneira e já que estou a pensar nisso, os idosos parecem-me ser tidos em grande conta; são tratados com bastante respeito. É bonito.

Que mais? As pessoas cumprimentam-me 99% das vezes. Eu penso sempre que é bom cumprimentar, mesmo que tenha que ser eu a iniciar o protocolo, porque no caso de necessidade, eu fui o branquela que disse “bom dia”, talvez valha a pena fazer um esforço para ele não falecer. Mesmo que tenham cara de quem não gostam muito de mim, torcem o nariz mas respondem na mesma. Acho que é automático.

Há um costume que eu acho louvável. Como disse, acesso a água não é fácil aqui. São raras as famílias que têm canalização nas suas casas. Portanto, uma actividade do dia-a-dia é a ida ao poço. Muitas vezes são as famílias que fazem um poço na sua casa para que possam ter acesso a água. O que é bonito é que, mesmo que tenha sido uma família a fazer um poço, as famílias vizinhas podem usar esse poço para tirar água. É quase lei não se recusar água a ninguém aqui. Em termos de vida em comunidade, isso é muito fixe.

Vou só falar de mais um costume que conheci da pior maneira. Numa certa ocasião, já para lá da hora em que era suposto eu ter almoçado, decidi retirar um pacote de sementes da minha mochila, para as comer. Antes disso, deixem-me abusar da vossa paciência e falar-vos deste pacote de sementes.

Quando soube que vinha para uma zona isolada com pouco acesso a coisas, preparei-me em conformidade, principalmente em relação à alimentação. Já instalado aqui em Cacine, tenho racionado algumas coisas para que vão durando até ao fim da minha estadia. Por exemplo, os dois pacotes de sementes que trouxe. Só abri o segundo a, mais ou menos, 2/3 da minha estadia.

Voltando à história principal. Decidi oferecer, por boa educação, às pessoas que estavam comigo, maioria guineense, entregando o pacote de sementes. E não é que o pacote não voltou?! Granda lata, a ideia era tirarem um bocado, o suficiente para enganarem a fome, e devolverem-me o pacote, para que eu pudesse consumi-lo nas semanas seguintes, em pequenas porções. Quem foi enganado fui eu! Fiquei uns 2 minutos zangado a pensar sobre isto mas depois pensei “Jovem Português, esse protocolo de receber coisas e só retirar um bocado para ti, por boa educação, é a tua cultura, não é a cultura guineense. Estás a ser zé”. Fiz a paz comigo mesmo e aprendi a lição. Agora não ofereço nada a ninguém. Estou a brincar, vá.

 

Fim das histórias. Os choques culturais podem ser difíceis na altura mas, quando ultrapassados, estão a tornam-me uma pessoa mais culta e “maleável”. Além disso, geram histórias caricatas para dinamizar o meu dia e para vos contar, mesmo que seja num post grande para cacete. É muito isto.

 

P.S.: Descansa em paz, pacote de sementes. Foi bom conhecer-te, mesmo que tenha sido brevemente.

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Aqui está mais um post que faz o relato visual da minha experiência aqui e que complementa os textos que escrevo. Relembro que o meu instagram está mais hipster que nunca e que aparece pouco a minha cara, pelo que pode ser interessante para o leitor deste blog.

 

Estes são aqueles formigueiros que aparecem nos filmes, mas aqui são verdadeiros. 

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 Isto foi depois do desembarque, no porto de Cacine. Desconheço este senhor que pediu para lhe tirar uma foto.

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 Parecendo que não, isto é uma escola composta por duas salas de aula, numa tabanca chamada Campiane.

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 Mais uma foto do desembarque no porto de Cacine

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 Uma foto artistica na praia de Cacine. O Professor Alia a exemplificar como se faz o pino. 

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 Mais uma daquelas coisas que só se vê nos filmes, as árvores bem ao estilo do Rei Leão.

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 A praia de Cacine. A areia que vêem é quase a totalidade de areal que há quando a maré está cheia. 

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Alguém me sabe dizer que bicho é este?

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 Um jovem português na Guiné-Bissau feliz porque vai beber água de côco acabado de apanhar da árvore.

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 Na ilha do mel. Duvido que muitos turistas tenham ido lá, foi um privilégio para mim conhecer o sítio.

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 A caminho da ilha do mel. A foto está bonita, mas o barco estava furado e, de tempos a tempo, um dos tripulantes tinha que tirar água com um balde. Coisas di tera.

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Pelicanos, no rio de Cacine. U...AU.

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Praia incrível, em Cassumba. Completamente deserta.

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Benfica de Cacine. Estou a brincar, é a equipa de Cacine (de vermelho). O futebol que se pratica aqui é mais violento que qualquer treino de boxe que eu já tenha feito.

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Pelas fotos, parece que só ando aqui a passear. Na verdade, o que acontece é que máquina fotográfica não é material obrigatório dos professores. Portanto, só tiro fotos nos momentos de lazer. Juro que não vim aqui (só) passar férias.

 É muito isto.

 

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